sexta-feira, 28 de agosto de 2015

SOFRIMENTO PODE SER SINAL DE LIBERTAÇÃO


A magnifica borboleta apresenta em si todas as características latentes que posteriormente serão desenvolvidas para que ela viva uma nova realidade; aquela que sempre foi inerente a sua essência. Assim como a transformação da lagarta em borboleta é um processo lento, profundo, delicado e doloroso, onde ela irá se esforçar para libertar-se da sua condição de lagarta, achamos que os processos de transformações pessoais necessários não são diferentes e que nunca irão acabar. A vida não é estática e está em constante mudança, nunca permanecemos os mesmos, somos sempre devir, em processo de construção continua. Porém, muitas transformações, assim como a da lagarta, trazem em seu bojo a companhia do sofrimento…
O sofrimento faz parte da condição humana, sendo as vicissitudes da vida companheiras inseparáveis de qualquer cultura, fase do desenvolvimento, condição socioeconômica, intelectual, geográfica, de gênero e época. O sofrimento esteve sempre presente no decorrer dos tempos, na nossa existência, fazendo parte de acontecimentos indesejáveis e dos reveses inesperados. As tristezas e as dificuldades sempre se mesclaram com momentos de alegria e realizações no percurso das nossas vidas. Ninguém vive a plenitude de uma vida sem transformações e sofrimentos; e ele, muitas vezes, sorrateiro, chega de maneira inesperada, rói e corrói tudo o que parecia estar em perfeita ordem e harmonia. Chega na surdina, onde acreditávamos que tudo estava sob nosso pretensioso controle. Muitas coisas estão sob o controle de nossas ações e cabe a nós evitarmos o sofrimento; no entanto, para outras, não possuímos este controle, o que gera impotência e angústia.

Mas será que de fato nos preparamos para as grandes transformações da vida?
Na realidade, nascemos no sofrimento e este sempre nos acompanhou, assim como os momentos felizes. O sofrimento não é a unica forma de aprendizado, mas infelizmente sempre o relegamos pelo motivo obvio de que não é agradável sofrer. Por outro lado, não tivemos uma educação para lidar com o sofrimento. Os processos educacionais não nos ensinam metodologias eficazes de modo a explicitar sobre como retirar do sofrimento o sumo da sabedoria que as experiencias pouco felizes reportam. Vivemos em uma cultura hedonista, dos prazeres fugazes, efêmeros e momentâneos. Devemos ser felizes o tempo todo, obrigatoriamente. Mas a lagarta em seu processo não estava feliz, ela estava enfrentando um desafio para uma nova realidade que lhe proporcionaria a liberdade. A lagarta “compreende o sofrimento”, pois “sabe” que o esforço e as dificuldades são os geradores da conquista de sua liberdade.
Sendo a vida um desfilar constante de transformações, neste baile de mascaras, percebemos e interpretamos a realidade de modo inteiramente pessoal. Muitas vezes, nos contentamos com uma realidade que não existe, repercutindo em um vazio existencial imenso. Não queremos sair de nossa zona de conforto. Não existe espaço para as grandes transformações, para o trabalho do luto, do choro, da tristeza e nem da dor, como se elas não existissem e não trouxessem consequências.
Sendo a vida feita de (re) construções, de (re) avaliações, composta de alegrias, de perdas, de renascimentos e de renovações incontáveis,acredito que não estamos preparados devidamente para os revezes que porventura este cenário possa trazer. Ter uma educação para o sofrimento não significa ser masoquista, gostar de sofrer ou querer provocar o sofrimento. Significa que não podemos negar que momentos difíceis existem, que virão e que deverão ser “encarados” como desafios, de maneira inteligente e resiliente. Ter educaçao para o sofrimento não utiliza a metodologia do sofrer por sofrer, mas como meio de aprendizado e evolução. Além disto é ter também direito ao nosso espaço para elaborar a própria dor dentro do tempo que se faz necessario; é desenvolver a sensibilidade, a receptividade e a capacidade de compreensao e empatia para acolher também o sofrimento do outro. Através do sofrimento bem vivenciado nos humanizamos e nos tornamos mais receptivos.

Mas, por que sofremos? Qual a sua finalidade e utilidade? Como podemos nos beneficiar com o sofrimento? Como lidar da melhor maneira possível?
A religião e a Filosofia tentam compreender os processos de perda, bem como explicá-los, cada uma a seu modo. Psicólogos, sociólogos, educadores, pensadores de todos os vieses apresentam a sua contribuição de acordo com seus valores e crenças. A ciência, por outro lado, também desenvolveu muitos recursos através de estudos e pesquisas e deseja encontrar todas as respostas para o sofrimento de modo a retirá-lo ou dirimi-lo.  É inquestionável que houve muita melhora na qualidade de vida e no bem-estar de modo geral, suprimindo muito o sofrimento do repertorio da condição humana, mas ainda temos muito a fazer e a conquistar neste campo.
Neste contexto, podemos concluir que o sofrimento é sempre resultado da ignorância, da falta de conhecimento e consciência. Em outras palavras, é a condição de ignorância e alienação que nos traz sofrimento. Neste caso, é necessária uma educação voltada para a nossa capacidade de compreensão do nosso mundo interno e externo e de auto-conhecimento. Se por um lado o sofrimento nos faz desenvolver a capacidade de compreensão, sensibilização e humanização, temos o dever de melhorarmos em todos os campos e áreas que possam favorecer um mundo melhor, pois quando nos reportamos a dor, consequentemente nos remetemos aos conceitos de transformação e libertação, bem como o que você percebe como tal. O que pode ser fonte de sofrimento pra você, pode não o ser para o outro.
Sendo assim, é necessário intuirmos o que o sofrimento está tentando nos comunicar, a lição e o aprendizado que devemos internalizar. Sem este processo, a experiencia de dor perde o sentido e torna-se inócua, sem proveito. Aprenda e evolua com o sofrimento. Saiba que a maioria das vezes somos nós mesmos que nos auto-infligimos a dor.
Refletir sobre a nossa postura na contribuição de algum sofrimento é o primeiro passo para o processo de aprendizado e libertaçao que a dor nos traz. Mas nunca se esqueça: Todas as nossas experiências apresentam o viés de nossas percepções; e acredite, com o sofrimento não é diferente. Sofrimento é o que você percebe como sofrimento. Mas de qualquer modo ele traz o sentido de libertaçao.
(Por Soraya Rodrigues de Aragão)

SOBRE ACASOS E IMPROVISOS



"Por algum motivo desconhecido que deve ter surgido de alguma mensagem da mídia, ou de algum filme da Disney, inconscientemente a gente acredita que na vida os momentos bonitos e os encontros significativos serão capturados por nós quando estivermos bem preparados.
Por algum motivo, acreditamos que se traçarmos as rotas e nos conhecermos muito bem, faremos na vida escolhas mais assertivas que nos trarão felicidade.
Por algum tempo, pensamos que a pessoa que se encaixa nos nossos sonhos e que é a companhia ideal pra nós é aquela com quem compartilhamos os mesmo interesses, aquela que vamos encontrar naquele dia em que nos arrumamos tão bem para aquele evento interessantíssimo.
Por algum tempo, pensamos que sabemos exatamente o que esperamos do ser amado. Temos até uma listinha pequena das qualidades essenciais que nosso amor deve ter e então já não olhamos para ninguém mais fora disso. Afinal, pedimos pouco da outra pessoa, ela tem apenas que se encaixar na lista, senão não entra neste coração.
Por algum tempo, pensamos que a melhor viagem de nossas vidas é aquela em que tudo foi bem organizado, em que pagamos por meses as prestações daquele cruzeiro que oferece jantares inimagináveis e festas na piscina e vai parando em várias praias paradisíacas do Caribe.
Por algum motivo, temos certeza que seremos completamente realizados profissionalmente quando conquistarmos aquela posição alta na nossa área de atuação, e quando formos, finalmente, bem remunerados e bem reconhecidos por nossos esforços, dedicação e conhecimento.
Por algum tempo, pensamos que a vida é um caminhar linear, e que o percurso está cheio de caixinhas de presentes esperando para serem abertas. Encaramos a vida como um videogame em que conforme vamos dando o nosso melhor e avançando nas fases, as caixas de presente vão se desembrulhando em estouros de felicidade e recompensas.
Mas por algum motivo muito desconhecido, muito provavelmente, a pessoa com quem compartilhamos os nossos dias malucos, cruzou o nosso caminho naquele dia em que fomos á padaria sem sutiã e descabelada, ou que chegamos suados, depois do futebol, na festa do nosso melhor amigo.
Aquela pessoa bonita e ideal que por meses jogou com a gente aquele excitante e cansativo jogo de esquenta e esfria. Aquela pessoa que se dá um pouco e depois some, que mostra apenas as suas qualidades e que faz a gente acreditar que o papo sempre será bom, a química sempre será grande e os encontros sempre serão empolgantes. Por algum motivo maluco da astrologia, essa pessoinha não entra na nossa rotina.
Por algum motivo desconhecido, quem reparte os dias conosco não é aquela pessoa que faz nosso sangue ferver e a paixão aflorar todas as vezes que olhamos para ela.
Provavelmente, a pessoa que faz parte da nossa rotina é aquela que enfrenta de mãos dadas os dias de tédio. É aquela pessoa que nem sempre entende os nossos gostos peculiares, que veste aquela camiseta esquisita quatro vezes por semana, que espera da vida coisas diferentes da gente. Mas que por algum motivo, sabe nos abraçar quando as lágrimas querem despencar, nos olha com ternura naqueles dias em que nos sentimos monstruosos, nos deixa ser idiotas e infantis e nos faz gargalhar com aquela imitação sem graça do Silvio Santos.
Por algum motivo desconhecido, a viagem que realmente marcou a nossa memória foi aquela de última hora, naquele ônibus velho, com aquele grupo de amigos mais velhos ainda, que nos levou para aquela casa mofada para passar uma semana naquela cidade que não parava de chover.
Por algum motivo estranho e desconhecido, depois que alcançamos a posição mais almejada na nossa área profissional e colecionamos títulos e elogios, nos lembramos com os olhos cheios de saudade e melancolia daquela lanchonete que trabalhamos na adolescência tentando juntar dinheiro para uma viagem de fim de ano.
Por algum motivo desconhecido, o que de verdade na nossa vida ocupa espaço significativo e nos faz sermos pessoas talvez não completas, mas inteiras, não são os roteiros bem estruturados, os encontros de cinema, as paisagens de cartão postal, ou a elevada posição profissional.
O que realmente faz sentido na nossa vida são os encontros repentinos, os olhares ternos no acaso, o amor que transborda mesmo despreparado, as interrupções no nosso centrado caminhar.
Somos grandes pessoas não porque no nosso currículo de vida colecionamos lugares fascinantes, amores de perder o fôlego e muitos títulos. Somos pessoas grandes porque criamos grandes histórias com o que temos de ‘pequeno’.
E a vida que não tem mesmo chance de ser passada a limpo, é o grande teatro do improviso. E um bom improviso só requer olhos atentos e criativos.
Então, espero para mim e para você, que a vida não seja apenas feita de conquistas épicas, mas que cada passo do nosso caminhar seja doce em si mesmo".
http://www.clarabaccarin.com/textos

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

MAL DE ALZHEIMER - POESIA


Quem irá cuidar de você, se o seu corpo estiver aqui e você partir.
Quem não lhe conhece pode pensar que está a fingir
Vendo-lhe sadio caminhando e a conversar.
Mas não sabe do seu sofrimento, e das coisas básicas que não consegue praticar.
 Pois o mal de Alzheimer lhe tomou o direito de ir e vir.
Tomou-lhe o direito de beber, o direito de se alimentar e se vestir.
Tomou-lhe o direito de sozinho poder caminhar.
Tomou-lhe o direito da sua família reconhecer, tomou o direito de amar.
A vida lhe fez novamente ser dependente de atenção, assim como uma criança.
Pois tomado por esta doença, só lhe restam lampejos de lembranças.
O mal de Alzheimer tem cura, e a cura é o amor nisto você pode crer.
Para o mundo você pode ser uma pessoa, mas para uma pessoa o mundo é você.
( Autoria: Marco Casagrande)

LEMBRANÇAS, QUE LEMBRAIS MEU BEM PASSADO


Lembranças, que lembrais meu bem passado
para que sinta mais o mal presente:
deixai-me, se quereis, viver contente,
não me deixeis morrer em tal estado.

Mas se também de tudo está ordenado
viver, como se vê, tão descontente,
venha, se vier, o bem por acidente,
e dê a morte fim a meu cuidado.

Que muito melhor é perder a vida,
perdendo-se as lembranças da memória,
pois tanto dano faz o pensamento.

Assim que nada perde quem perdida
a esperança traz de sua glória,
se esta vida há-de ser sempre em tormento.
(Luis de Camões)

MAL DE ALZHEIMER