" Sempre
é tempo de pedir perdão, porque só nós sabemos o quão difícil é a
tarefa que nos coube nesta vida. Compreendo as suas fragilidades e peço
que, de alguma forma, espiritualmente que seja, compreenda também as
minhas. Estamos na mesma escola, somos mestres e alunos, aprendemos
juntas a ultrapassar as dificuldades que surgem a cada dia e evoluímos
com o sofrimento ao qual fomos submetidas. Hoje, sei que já venci o medo
do desconhecido, deste universo oculto em que você vive. De alguma
forma consegui penetrar nele e te compreender, te aceitar e a buscar
sempre a melhor forma de te reconfortar.
Aprendi também a ser paciente, a caminhar no seu passo, a interpretar o
seu silêncio e suas frases desconexas... Aprendi que, nas voltas que o
mundo dá, nossos papéis foram trocados, que de filha passei a ser sua
mãe e você a ser minha filha. Aprendi a trocar fraldas (em pé, mas tudo
bem), a fazer suas "mamadeiras e papinhas", a te dar banho e a te por
pra dormir... a vida ensina!
Mas
nem tudo são flores... sabemos que esta doença é ingrata. Qualquer
alteração no seu metabolismo afeta seu humor e nosso convívio torna-se
difícil. Neste momento, vem à tona todo o estresse a que somos
submetidas dia a dia. Bate, em mim, o desespero de arcar com tudo
sozinha, noite e dia, de domingo a domingo, ano após ano, trancada neste
apartamento, vendo sempre a mesma paisagem e me sinto sufocada... te
culpo e me culpo, falo coisas que te maltratam e me martirizam, porque
sei que você esquece, mas em mim elas ecoam dolorosamente.
Sei que há momentos em que é preciso ser dura, sem perder a ternura
jamais (como bem disse o Che), porque você voltou a ser criança e, como
tal, faz birras, malcriações e inúmeras artes que merecem uma
repreensão. Já me acostumei a não ter identidade. Às vezes, sou Monica, a
sua filha; noutras a sua irmã Zezé e sou também a Terezinha, que não
sei quem é, mas não me importo porque sei que sua alma me reconhece.
Me
alegro quando você ganha peso, me entristeço quando perde uns
quilinhos, dou risada das suas caretas e me irrito quando você chama meu
nome um bilhão de vezes dizendo que quer ir pra casa. Adoro te fazer um
chamego e te fazer de boneca (quando faço chiquinhas e ponho frufrus no
cabelo). Me enterneço quando vejo você e a Nic dormindo no sofá, uma
cuidando da outra, dois bebezinhos!
Mas
ainda acho que é pouco. Hoje tenho consciência que tudo que faço está
de acordo com o meu entendimento naquele instante e que, no momento
seguinte, posso ampliar minha compreensão e me perdoar pelos erros e
acertos. Porém, sempre é tempo de pedir perdão pelas frases não ditas,
pelo carinho negligenciado, pelo beijo não roubado. .. pedir perdão pela
língua afiada, pela lágrima derramada e pelo egoísmo que me cega.
Quero que saiba, minha criança grande, que serei sempre grata pela
oportunidade de servir, de aprender a crescer pela dor, porque só ela
nos conduz no verdadeiro caminho da evolução, onde deixamos de ser
animais para nos tornarmos verdadeiramente Humanos.
Só
quem passa por esta experiência é capaz de compreender o alcance das
minhas palavras, de sentir a minha dor e compreender os meus conflitos. E
são muitos e como imã se atraem. Sempre encontro pessoas que passam
pelo mesmo problema. Vou ao supermercado e ouço furtivamente uma
conversa - uma senhora, confidenciando a outra, que decidiu internar a
mãe, portadora de DA, num asilo. O sofrimento e o peso da decisão
estavam estampados no rosto dela, e me abstive de julgamentos. Pela
manhã, quando saio pra passear com a Nic (minha poodle) encontro com uma
senhora que adotou um cãozinho abandonado (um poodle chamado Elvis).
Ela o encontrou coberto de chagas, que lhe renderam a amputação de uma
das patinhas traseiras. Hoje, ele está saudável, gordinho e sobrevive
com seu "tripé". Certo dia notei que ela estava abatida, com ar de
cansaço físico e mental e, então, ela me confidenciou que descobriu que a
mãe está com Alzheimer, em estágio inicial. Talvez Deus as coloque em
meu caminho para que eu não me sinta sozinha, para que eu perceba que
sou forte e não fujo à luta, por mais espinhosa que seja a minha missão
(jamais admiti a ideia de internação) e para que eu possa confortar quem
está apenas iniciando essa caminhada..." (Monica Devienne)
A procurar Epigrafes para meu TCC, me deparo com esta carta que me emocionou. Imensa sensibilidade e carinho através das palavras.
ResponderExcluirlindo... me identifico com tudo que tu falar.minha mãe também tem D.A.e sei que a dor é grande mas um sorriso dela me dá forças e motivação para seguir sempre em frente.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
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ResponderExcluirSei entender muito bem essa dor de cuidar de um uma pessoa q tanto amamos! e que tanto fez por nós!! cuido de minha mãe a 3 anos!essa doença nos açoita nosso corpo,fere na alma! mas q no final aquele q resistir saira bem forte!!!Qptei em permanecer ao lado dela até o fim!!
ResponderExcluirSei entender muito bem essa dor de cuidar de um uma pessoa q tanto amamos! e que tanto fez por nós!! cuido de minha mãe a 3 anos!essa doença nos açoita nosso corpo,fere na alma! mas q no final aquele q resistir saira bem forte!!!Qptei em permanecer ao lado dela até o fim!!
ResponderExcluirSem palavras....A identificação pela emoção ganha terreno e germina, consequência, as lágrimas.
ResponderExcluirMe identifiquei também . Cuido sozinha de minha mãe com 85 anos e com Alzheimer. È muito muito muito difícil. Toda minha família, (irmãos, cunhadas, netos, sobrinhas), a abandonaram. Mas hoje ela é a minha vida. Neste site conto um pouco de nossa vida: Minha mãe, e o alzheimer / neusa@360
ExcluirEmocionante sua carta, passo a mesma situação todos os dias e me sinto tão impotente de não poder mudar nada é tão estranho mudar o papel de filha para mãe, mais o amor que tenho por ela é tão grande que me fortalece e me ajuda a seguir. Minha mãe meu presente. Parabéns pelo depoimento e pela iniciativa de mostrar as pessoas como vivemos dia a dia com essa doença ingrata. Força para caminhar. Grande abraço Tathi e Lourdes.
ResponderExcluirEsse texto me emocionou muito, pois eu e meus irmaos estamos vivendo essa mesma situação! Não pretendo abandonar minha Mãe em um azilo...
ResponderExcluirMeus irmãos se revezam à noite e eu cuido dela durante o dia e tenho feito de tudo pra mante-la bem fisicamente, mas é muito triste ve-la se definhando a cada dia...
Há 5 anos minha mãe, que até então era uma mulher ativa, trabalhadeira, inteligente, ótima mãe, começou a dar sinais de um comportamento estranho. Com sérios problemas de coluna, teve uma herpes zórters, foi para uma cadeira de rodas, e então veio morar comigo. Meses depois, veio o diagnostico do Alzheimer. Os surtos eram terríveis. Cuido dela sozinha. Não tenho suporte nenhum afetivo dos meus irmãos, nem de nenhum familiar. Todos nos abandonaram . Sei o que vegetar vivendo a vida vegetativa de um ente amado. Meu único recurso é escrever. Fiz um site: Minha mãe, e o alzheimer. neusa@360 - Lá registro muito dos nossos sentimentos. Força querida. Estamos juntas nessa. Beijo em seu coração.
ResponderExcluirMeu Pai também esta nessa situação e que mais me dói e a distância.Eu moro em São Paulo e ele no Rio Grande do Norte sempre que posso vou visitá-lo e percebo que a cada ano ele fica mais distante e não me reconhece,como e duro saber que o meu Pai não sabe quem eu sou o que me conforta é saber que eu sei que ele é o meu PAI..
ResponderExcluirCuido da minha mãe há 7 anos,mudei totalmente a minha vida,aprendi e estou aprendendo a cada dia a suas mudanças seus comportamentos;não é facil;o que me deixa mais feliz é poder olhar todos os dias e chamar de mãe;mesmo ela não me conhecendo;
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