Ontem à tarde, assentei meus olhos em uns escritos sobre a
velhice, de Marco Tulio Cícero, filósofo
de escrita elegante. Mas, encontrei algumas coisas com ímpetos um pouco
patéticos, ao falar dos velhos e da morte. Foi um tanto desconfortável, e
fiquei a refletir.
Confesso que algumas coisas me abateram, é difícil admitir
que a perspectiva de morrer seja natural para os velhos. Não por acreditar na
nossa perpetuação, somos finitos, mas por ter a consciência de como e em que
circunstâncias os velhos se aproximam do fim. Nenhum velho desapega-se da vida
de uma maneira natural, aceitando conformado o que lhe é arrancado com
brutalidade. Eles calam, silenciam, encobrem. Mas eles pensam, sentem e, quando
a sós, choram... E isso é tenebroso para os filhos.
Enquanto estiver existindo lucidez, existirá o instinto de
conservação, o apego à vida. A esperança.
Não contradigo, no entanto, que os velhos não possam
perceber a morte, porém não com resignação, mesmo acreditando que possa existir
outra vida.
Fiquei algum tempo a pensar na morte, o que não me foi nada
agradável, pois sou uma pessoa alegre e otimista. Mas isso se deu pelas minhas
primeiras perdas, já que nunca tinha me deparado com tal sentimento, com esta
situação dilacerante da perda de alguém tão próximo. E aos poucos...
Penso que o ato de morrer deveria vir como um presente, como
uma dádiva - se é que Deus existe -, sem sofrimento e sem dor, tanto para os
que vão, como para os que ficam. Até como recompensa por nossos velhos terem
sido corajosos, por terem trilhado caminhos difíceis ou vivido, alguns, numa
festança quiçá equivocada. Seria um ato de misericórdia D’Ele. Sei que estou
sendo utópica, mas se assim fosse, amenizaria um pouco nosso sofrimento.
Ver e sentir tal dor de perto e achá-la natural não existe,
o que existe é um conformismo. Acredito nisso. E surgem as perguntas - algumas já conhecidas.
E nehuma resposta.
O ser humano sempre precisou acreditar na perpetuação da
vida através do espírito. Não importando o caminho. Confesso que eu ainda não
sei de nada, até gostaria de acreditar em algo. Desde sempre o homem procurou
acreditar em um Deus. Ter fé é como ter um coringa; é sorte e um
privilégio.
Os homens sempre foram em busca de um Deus, seja em Cristo
ou venerando o Sol, a Lua, enfim, a vários elementos onde um ser superior
pudesse ser representado com grandeza e perfeição para atenuar nosso morrer ou
nossa 'passagem'.
Porém, se ao ter lido aquele trecho de Cícero fiquei com uma
sensação desconfortável, mais tarde recuperei-me com a paz e a doçura de
Gilberto Freire quando diz: Venha doce morte... Não, a morte não é doce, mas
peço a amarga morte que ela venha docemente...
Seria um sonho se assim fosse: tanto para os que têm fé como
para outros que ainda buscam encontrar a sua paz.
Espero, no entanto, quando meu dia chegar, quando meu olhar
tiver o brilho opaco da despedida, que eu tenha a doce ilusão de que a morte
não me venha tão amarga, que me toque docemente e, sobretudo, com compaixão.
(Tais Luso de Carvalho)
Nenhum comentário:
Postar um comentário