Especialista comenta a difícil
tarefa de cuidar destes pacientes e explica como os profissionais podem cuidar
da própria saúde mental. Quem cuida de pacientes com
doenças degenerativas convive diariamente com a dor e o sofrimento dos
pacientes. Para isso, além de ter vocação e paciência, é preciso saber cuidar
de si próprio.
A psicóloga Ângela Utinguassú dos
Santos é especialista em trabalho junto a idosos com demências e tem
experiência de 13 anos no ramo. Nesta entrevista, Ângela conta quais são os
principais desafios desta difícil tarefa de cuidar de pacientes idosos, e o que
o cuidador pode fazer pela sua própria saúde mental.
Vida — Quais são os requisitos
fundamentais de um cuidador de pacientes com doenças degenerativas?
Ângela Santos — Um bom cuidador
tem que se conhecer o suficiente para saber se conseguirá conviver com a dor,
com o sofrimento dos pacientes de Alzheimer e demência. Saber se vai se
adaptar, se terá paciência. As características são mais de personalidade do que
de ferramentas. Essa parte existe para ajudar as pessoas, mas o perfil é mais
importante. O que tenho percebido nas casas geriátricas e nos lares são pessoas
do sexo feminino, faixa etária acima dos 30 anos, que já têm uma noção do que
querem da vida. Não são pessoas oportunistas, não fazem pelo dinheiro. São
pessoas que gostam de idosos. Isso é fundamental. É um caso de vocação.
Vida — O que o cuidador precisa
saber sobre Alzheimer e demências?
Ângela — Nota-se atitudes fora
dos padrões habituais da pessoa. Se um dia a pessoa tem comportamentos atípicos
e não se dá conta, não percebe o que acontece consigo, é um indício. Ela apaga
trechos do texto da sua vida. Por exemplo, diz que nunca foi casada, nunca teve
filhos. Outra questão comum é a capacidade cognitiva, não consegue aprender
mais nada. Lê um texto e não consegue memorizar. Busca uma palavra e não
consegue lembrar. As sinapses já não acontecem fluentemente, até o ponto em que
a pessoa não consegue mais se comunicar consigo e com os outros.
Vida — E como o cuidador deve
cuidar de si próprio?
Ângela — Ele tem que estar
presente para si em todos os momentos. Fazer exercícios físicos é fundamental.
Se não pode fazer academia, faça caminhadas e exercícios aeróbicos na rua.
Psicoterapia também ajuda. Outra questão é ter uma convivência com grupos de
amigos, ter alguma fonte de lazer, ir ao cinema. Muitos cuidadores são pessoas
de baixo poder aquisitivo e, às vezes, não podem fazer tudo isso. Então, a
saída é conviver com pessoas de bom humor, visitar, ser visitado, ter uma vida
biopsicossocial e espiritual. Ter um leque de alternativas para que a vida
desse cuidador possa ter um espaço reservado sempre para si. Esse trabalho mexe
muito com o emocional. Mexe com o conceito de como será nossa velhice, se faz
identificações diariamente. É horrível sentir a atmosfera de finitude, a
ausência de perspectiva e perdas constantes. Diante de situações de estresse, irritação,
tem que parar, conversar com a equipe.
Vida — Dentro das clínicas
geriátricas é comum haver espaço para os cuidadores?
Ângela — Nem todas dão espaço. Os
técnicos de enfermagem acabam incorporando as atividades de cuidador. Aquele
que estimula o idoso, troca, faz terapias, atividades sociais com o idoso, traz
ele para a vida. São os nossos técnicos de enfermagem que estão fazendo isso.
Mas muitos deles não estão a fim de fazer isso. Apenas se limitam ao
procedimento padrão. Por isso, precisamos formar cuidadores. E salientar a
importância de eles aprenderem a cuidar de si mesmos. É importante que os
familiares também façam cursos de cuidadores, pois muitas vezes o cuidado recai
sobre um filho, um neto. É importante que as famílias tenham essa consciência.
Não basta colocar o ente querido nas mãos de alguém bem indicado. Nessa questão
de demência e Alzheimer é preciso se informar, se munir de ferramentas. No
futuro, as famílias terão de se instrumentalizar.
Vida — Esse ramo está se tornando
um nicho importante de mercado, tendo em vista que as pessoas estão vivendo
mais. Quanto custa, em média, para manter um idoso bem cuidado?
Ângela — Recentemente foi
homologada a lei das empregadas domésticas, e o cuidador está dentro da mesma
legislação. Eu vejo que cada família combina um valor de acordo com a situação.
Há residências que têm enfermagem, psicoterapeuta, fisioterapeuta. O custo
varia muito, mas é um trabalho caro, pode variar ente R$ 800 e R$ 1,2 mil
mensais, dependendo se o cuidador dorme ou não no local, se tem formação e
conhecimento, se é amigo da família. Eu luto para que esse trabalho não se
torne puro negócio, como algumas geriatrias são. Mas não é fácil. Esse é um
trabalho quase missionário. Pela minha experiência, penso que a convivência com
a família deixa o idoso mais à vontade no seu meio, ao contrário daquele que
vive em clínica, que é o idoso institucionalizado, cheio de regras, horário e
atividades com hora marcada. (CADERNO VIDA ZERO HORA).
http://zerohora.clicrbs.com.br/
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