Os avanços da medicina
conferem aos seres humanos uma expectativa de vida cada vez maior.
Todos querem viver mais, viver bem, viver com integridade. Todos
querem chegar a idades avançadas com suas capacidades de pensar,
sentir e agir preservadas e íntegras.
São os momentos mais
simples e inesperados que queremos guardar para sempre. São as
imagens de rara beleza ou emoção aquelas que instantaneamente o
nosso cérebro registra fotograficamente, e arquiva no infinito
“disco rígido” da memória humana. Recordações que, no final
de uma vida, constituem a história de cada um de nós. E sem as
quais perderíamos o sentido da vida. Instantes em que queremos
guardar para sempre, quase sempre ligados à infância e à família.
Ao amor. Aos outros em nós.
A memória pode ser
manipulada e expandida. Recordar é, em grande parte, reinventar,
reorganizar nosso passado e inseri-lo em uma narrativa que compõe
nossa subjetividade. Não há ninguém de nós que esteja preparado
para apagar suas memórias, suas conquistas afetivas e cognitivas
como se fossem um texto provisório traçado a lápis.
Queremos nossa
história alicerçada e protegida em solo firme e seguro. Queremos
nosso passado bem guardado, a salvo de ser tragado pela areia
movediça do esquecimento, ou seja, pelo Alzheimer.
E quando isso acontece... Esse mal estranho nos causa medo porque
atinge nosso fundamento e nosso indivíduo: nosso espírito, nosso
discernimento, nossa identidade. A doença se nutre de tudo,
engolindo com ela as lembranças de uma vida. Tudo se torna diáfano:
um esquecimento de si, uma dissolução existencial.
É
nesse sentido que o Alzheimer se torna muito mais devastador do que a
doença do esquecimento. Ele compromete a coerência necessária para
que tenhamos um “self” e, com isso, faz que a própria
subjetividade entre em colapso.
Minha
amada mãe está sendo cada dia mais tragada pela areia
movediça do esquecimento. O fluxo de suas memórias está cada vez
mais acelerado para um vazio total. Elipses temporais, já não
consegue diferenciar entre o passado, presente e futuro. O tempo
começou a se fundir em uma única peça.
O Alzheimer vem para ficar, permanece com as famílias, marcando suas
vidas e tomando cuidado para que você nunca se esqueça o caos que
esta doença faz ao nosso amado (a) e em nossos corações. É como a
chegada de um ciclone (tempestade, vendaval, areia movediça, ….),
mudando totalmente a rotina dos familiares: seu cotidiano, seus
projetos e sonhos, se os tem, são mexidos e remexidos não deixando
pedra sobre pedra. Modifica o espaço físico e temporal e tonteia
fortemente o psiquismo. Os afetos são “bulidos e remexidos”.
Há
uma frase que eu admiro e amo: “Deus nos deu memórias para que pudéssemos crescer flores no inverno de nossas vidas”. Para um
doente de Alzheimer é sempre inverno, por isso temos de tentar ser
um pequeno raio de luz, regando aquelas flores que não podem
crescer”.
Como
te amo amada mãe.
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