sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

ABRAÇAR É ACOLHER A HISTÓRIA DO OUTRO

Quanto vale um abraço?

O CUIDADO NO ACOLHER HISTÓRIAS!
Apesar de toda a cultura que permeia as relações no século XXI, falta muito acolhimento. Acolher significa hospedar, agasalhar, receber, atender, aceitar, dar ouvidos a, abrigar. Quando você abraça alguém, divide com este alguém o seu espaço pessoal e abraça toda a sua história.  Talvez seja por isso que tantas pessoas não conseguem se entregar ao contato físico do abraço, pois é preciso ter lugar dentro de si para ceder ao outro.

Todo corpo é repleto de memórias. Cuidar do Ser é cuidar do outro que tem uma face – um corpo que tem um semblante único. Ao mobilizar seus conteúdos, é preciso delicadeza. Há corpos que não permitem aproximações devido a traumas de maus cuidados. Tais aproximações só existirão se ele conseguir compartilhar sua história e para isto será preciso o acolhimento de alguém.

Como exercer o cuidado se quem precisa não quer saber de cuidados? O movimento em direção ao outro não é fácil. O cuidador que não sabe dos próprios registros que carrega no seu corpo-memória, que segurança terá para ceder espaço interno ao outro?

Um cuidador necessita conhecer para compreender, auxiliar, proteger. Medo, raiva, mágoas ou outro sentimento negativo guardado por alguém, que deveria ter sido cuidado algum dia, poderão aflorar em hora imprópria. O cuidador está o tempo todo dando e recebendo informações. Seja na troca de olhares, seja na troca de uma roupa da pessoa que cuida. Ela percebe o cuidador pelo olhar, pelo movimento, pelo tom de voz. Por isto, há pessoas que rejeitam certos cuidadores, porque eles não lhe passam o que precisam sentir: segurança e afeto, alívio para suas dores através de alimento, remédios, higiene, atenção.

O ato de acolher é demonstrado em toda expressão corporal. No abraço, partilha-se a energia capaz de sanar dores psíquicas e/ou aliviar enfermidades. E, ao acolher a história do outro, também se recebe vida e energia do outro, transfere-se energias, faz-se uma “transfusão de almas, quando se pode transmitir uma mensagem de reconhecimento do valor e excelência daquele indivíduo. 

Além disto, o abraço reafirma a confiança nos próprios sentimentos. O cuidador precisa ser abraçado antes de abraçar, ser cuidado antes de cuidar, ser acolhido antes de acolher, ser alimentado antes de alimentar. Ter seu continente conhecido e estimado antes de penetrar no continente do outro. 

Quem abraça, também é abraçado. O colo. Tão necessário para que nos energizemos para continuar a enfrentar o nosso cotidiano. Ouvir o simples: venha... estou aqui, palavras sem rebuscamento algum, que são ditas por qualquer pessoa. Acolher não depende de classe social e nem de cultura. Abraçar é dar de si. Mas mais ganha quem dá. Reconhecer a simplicidade desse ato reside em vida e sabedoria.

Quando nos faltam as palavras, resta o corpo a abraçar. O corpo pode falar muito mais do que muitas frases. Até porque nem sempre a palavra dita é a adequada àquele momento, mas o abraço é universal, possui linguagem própria, provoca alterações fisiológicas positivas em quem toca e em quem é tocado, reduz a sensação de isolamento, de depressão e de ansiedade.

O abraço pode dar segurança, importante para todos as pessoas, e muito mais para as crianças e idosos, que são quem mais depende de quem os rodeia. Quando o medo se sobrepõe ao desejo de participar de algum desafio da vida com entusiasmo, é importante receber do cuidador a confiança necessária para avançar. Essa dependência é o que pensamos real.

No caso do cuidador esgotado no ato de cuidar, não há idade. Quem assume filhos especiais cuidará a vida inteira. Daí que é preciso compreender para poder cuidar dessas pessoas que se dedicam intermitentemente. Então podemos citar o mito de Sísifo (2009). Uma mãe nunca descansa, não pára de gastar sapatos, carrega o filho para todo o sempre.

Como estimular o cuidado a um cuidador? Se ele direciona toda a sua energia para cuidar do outro e não cuida de si mesmo, como auxiliá-lo? É preciso valorizar e cuidar dos cuidadores, pois cada vez a sociedade dependerá mais deles. São muitas as variáveis. Afirma SCLIAR (2008, p.5) que, além de vocação, o ato de “cuidar não é apenas questão de generosidade, é questão de técnica, de conhecimento. E exige dedicação.” Conhecer como os outros funcionam é importante se este conhecimento trouxer o autoconhecimento.

A palavra cuidador não está em qualquer dicionário. Mas ser cuidador é novidade? Seu significado está lá nas escrituras: os pastores que cuidavam de seu rebanho. A metáfora do cuidador: o papel dos familiares, dos professores, dos religiosos, dos avós, dos amigos, de todos os profissionais que cuidam de alguém e de tantos outros. 

Hoje, a quebra de paradigma está em olhar não para quem precisa de cuidados, mas “para quem cuida” e adoece no processo de cuidar. Acolher, abraçar e compreender, aceitar também suas dores, seus sentimentos de impotência, de raiva e de angústia, pois como todo ser humano, um cuidador também sente dores e tem suas mazelas. É preciso estimulá-lo a cuidar de si para que possa cuidar dos demais, pois um cuidador bem cuidado saberá cuidar melhor! (COSTI, 2008)

Os cuidadores, quando acolhem, autopreservam-se da dor? Esvaziados devido ao ato de doar-se continuamente, tornam-se uma árvore oca, frágil, pronta a tombar. Os cuidadores têm o direito ao autocuidado, tem direito de perseguir seus desejos e de seguir seus sonhos. Ir atrás dos desejos mais íntimos traz saúde mental, afirma Leloup (2007).

Um dos princípios do acolhimento é qualificar a relação trabalhador-usuário, que deve dar-se por parâmetros humanitários, de solidariedade e cidadania. O cuidador precisa receber, alimentar-se de humanidade, desenvolver a sensibilidade, qualificar-se, conhecer seus sentimentos de empatia e saber lidar com eles, antes de se doar. Quem não tem condições de se colocar no lugar do outro, não pode trabalhar na área da saúde. Mas empatia demais pode gerar sofrimento.  Mas como ter empatia e compaixão sem sofrer? Para cuidar, é preciso respeitar a si mesmo, reconhecendo os próprios limites. (Marilice Costi). 
 http://www.ocuidador.com.br

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