Antes
que me esqueça, quando vires o brilho das minhas lágrimas, não
fiques inquieta – são pura emoção. Não deixes que os ventos da
solidão as sequem no meu rosto. Beija-as com ternura, e olha-me como
se fosse a primeira vez.
Antes
que me esqueça, quando te sentares à mesa do jardim onde tantas
vezes conversamos sobre o que julgamos ser a nossa vida, completa os
poemas que nunca acabei – faltou-me sempre o complemento. Agora,
falta-me o predicado. E o sujeito.
Antes
que me esqueça, quando a cabeça te cair sobre a lareira, num misto
de dormência afetiva e cansaço, lembra-te das noites em que dançamos a Sad Waltz e me pedias: “só mais uma vez”.
Antes
que me esqueça, não deixes prolongar os silêncios, para nem tu
nem eu ficarmos com dúvidas que poderão transformar-se em mágoas
ou angústia. Acredita, não merecemos esses silêncios – não
temos certezas a dividir-nos.
Antes
que me esqueça, ajuda-me a afastar o cálice da tristeza. Quando
descemos o rio ,iniciamos um poema ainda não concluído. A noite
pertenceu-nos, desvendamos mistérios que não o eram, e acendemos
uma vela para iluminar o firmamento. Desenhaste um poema com as
estrelas, e vi os teus olhos cruzarem o céu. Guardo esse relance
para quando voltarmos ao rio,
e eternizarmos no mar toda a luz que nos iluminou.
Antes
que me esqueça, quando fores velhinha, e os ventos da saudade
assolarem as nossas memórias, lê, baixinho, a “Ode
to the West Wind”, de Shelley, como se me tivesses ao lado: Make me thy lyre, even as the forest is:
What if my leaves are falling like its own!
The tumult of thy mighty harmonies
Will take from both a deep, autumnal tone,
Sweet though in sadness. Be thou, Spirit fierce,
My spirit! Be thou me, impetuous one!
Drive my dead thoughts over the universe
Like withered leaves to quicken a new birth!
And, by the incantation of this verse,
Scatter, as from an unextinguished hearth
Ashes and sparks, my words among mankind!
Be through my lips to unawakened Earth
The trumpet of a prophecy! O Wind,
If Winter comes, can Spring be far behind?. (*). Depois, adormece, docemente – a manta de caxemira por baixo, as
estrelas por cima.
Antes
que me esqueça, afastemos de nós a tristeza.
Deixa-me ouvir “Blowin’ in the wind” e a minha sonata
preferida, de Nicolo Paganini, para violino e guitarra.
Tu sabes qual é. No fim, voltamos a dançar a Sad Waltz,
na varanda, com vista para o vale. Veste o vestido da
primeira vez. Ficavas tão linda. Sabes, continuo a amar-te,
como no tempo em que te amava.
Antes
que me esqueça, meus amores, não é um adeus.
É só um aceno de saudade de um coração à espera
da Primavera.
Antes que me esqueça do passado, bendigo todas
as luzes que me alumiaram o caminho que me trouxe
até aqui, especialmente tu, que continuas a ser
a luz que nunca se apagará no lugar onde guardo
o que nunca pertenceu a mais ninguém. Estiveste no
princípio, estarás para além de mim. Para além da Eternidade.
Antes
que me esqueça, e apesar de a vida, por vezes,
ser traiçoeira, lembra, até chegarem as horas tardias,
todos os sorrisos que trocamos, todos os olhares
que registaram a luz de cada momento, porque o nosso
amor foi e será sempre o único porto de abrigo seguro
das horas negras que a vida nos ofereceu.
Antes
que me esqueça, pronuncio a palavra “amor” como
uma espécie de santo-e-senha para descodificar
tudo o que interiorizamos e alertar os distraídos ou desconfiados
que o nosso segredo nunca teve outro sentido
ou outro destinatário.
Antes que me esqueça, lembra-te sempre que te
guardo desde quando comecei a sonhar. Não tinha o
tempo a perseguir-me. A saudade era um pensamento
futuro, agora um sentimento enevoado atravessado pela
luz ténue das memórias.
Antes
que me esqueça, projeta sobre mim um raio de
luz, para que as sombras da minha vaga existência não
me impeçam de ver-te sem medo de perder-te.
(Arnaldo
A. da Fonte)
(*) Faça-me tua lira, assim como a floresta é:
E se as minhas folhas estão caindo, como o seu próprio!
O tumulto das tuas poderosas harmonias
Terá tanto um tom profundo, outonal,
Doce embora em tristeza. Sê tu, Espírito feroz,
O meu espírito! Ser-me tu, um impetuoso!
Dirija meus pensamentos mortos sobre o universo
Como secou as folhas para acelerar um novo nascimento!
E, pelo encantamento deste versículo,
Espalhe, a partir de uma lareira unextinguished
Cinzas e faíscas, as minhas palavras entre a humanidade!
Seja através dos meus lábios para não desperta Terra
A trombeta de uma profecia! O vento,
Se trata de Inverno, Primavera pode ser muito para trás?
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