Só
quem convive diretamente com a Doença
de Alzheimer e
assiste à transformação daqueles que nos são queridos é que
consegue ter a percepção
do quão devastadora e destruidora ela é.
O reservatório de lembranças, bem maior da vida do ser humano, vai
sendo roubado gradativamente, até perder-se por completo.
Desaparece tudo ou são deixadas para trás, o que a pessoa guarda em
seu cofre mental, todos os sentimentos vivenciados, a sua própria
trajetória de vida.
Alzheimer,
um ladrão que age sorrateiramente, chega de mansinho e ninguém
percebe. É
impiedoso, frio, insensível. Um inimigo cruel e calculista. Vidas
vão se quebrando,tornam-se cacos, rouba a alma, o coração e a
dignidade da pessoa. Tudo
acaba em vida.
O
seu curso é marcado por uma deterioração gradual da função
intelectual, declínio na capacidade de realizar atividades de rotina
da vida cotidiana e de lidar com as alterações na personalidade e
também no comportamento. O
Alzheimer é uma despedida vagarosa,
que pode durar meses ou anos, é uma forma que os anjos nos dão para
acostumarmos com aquela ausência que um dia será eterna. Você
nunca saberá se aquele abraço ou o desejo de uma boa noite será
repetido ou entendido no dia seguinte, é tudo imprevisível, é como
se estivéssemos em um campo minado, sem saber como andar.
Quem
de nós já não experimentou a súbita ausência de um ente
querido? Mas mesmo com esse preparo de despedida que o Alzheimer
nos proporciona, no dia da real despedida, daquela sem volta,
entramos em choque, ficamos paralisados, alguns não se conformam,
outros se revoltam, uns momentaneamente perdem a fé de que tanto
tinham, nosso chão é tirado, ficamos sem rumo, sem lugar...
Conviver
com parentes que sofrem do mal de Alzheimer requer um verdadeiro amor
e um grande malabarismo, pois temos que, muitas das vezes, concordar
com fatos e datas que ocorreram apenas na mente do portador de
Alzheimer, precisamos ouvir com alegria as mesmas histórias repetidas vezes e dizendo que é a primeira vez que a ouvimos;
concordar que aquela cadeira ou aquele móvel não estava ali minutos
atrás ou que aquela mesa não cabe mais naquela sala e que deve sair
dali o mais rápido possível, devemos aceitar com alegria termos
nossos nomes trocados pelos nomes de outros irmãos...
“Fecho
os olhos, sigo o redemoinho das mais variadas sensações e começo a
mergulhar no mar revolto das emoções… uma correnteza de
sentimentos contraditórios me empurra para baixo, para cima, para os
lados… pensamentos, imagens, lembranças, são como gigantescos
icebergs, onde meus medos se chocam ou meus desejos ansiosos querem
aportar… escuridão e luz asfixia e ar silêncio e intensos
sons confusos vazio…” (sentimentos de um cuidador).
Quem
convive ou já conviveu com alguém portador de Alzheimer, com
certeza concordará com este “redemoinho das mais variadas
sensações...”. Facilmente entenderá que muitas vezes sentimos
navegando à deriva num oceano desconhecido e misterioso. Só uma
observação minuciosa, dedicada e intuitiva, pode nos servir de
bússola cujo ponteiro se devidamente norteado pelo campo magnético
do nosso grau de sensibilidade, apontará indícios de uma rota a ser
seguida.
Sabemos
que Alzheimer possui tratamento, um paliativo que permite melhorar a
saúde do paciente, retarda o declínio cognitivo, trata os
sintomas, controla alterações de comportamento. Com isto,
proporciona algum conforto e melhora as condições de vida do idoso
acometido pela doença.
Mas,
e para as
dores da alma?
Qual a medicação recomendada? Acredito que o companheirismo aliado
aos recursos da terapia do amor é um grande aliado ao tratamento das
dores da alma. Os ingredientes indispensáveis: carinho
e amor
, dedicação
e paciência,
bom
humor,
respeito,
tolerância e prudência ,
todos em dosagens máximas, com uso contínuo e permanente.
Como
cuidadora de minha amada mãe, procuro a cada dia aplicar os recursos
da terapia do amor.
Como
o amor se reveste de muitas facetas ou subtítulos, acaba deixando
dúvidas em quem está cuidando. O amor que muitos dizem não
conhecer, já o praticam nas mais variadas formas, porque amar, não
é apenas dizer “Eu te amo” de forma automatizada, sem sentimento
e de maneira irrefletida. É transparecer na expressão de uma emoção
ou de um ato como um olhar, um abraço, um beijo, um aperto de mão,
que representa muito mais que mil palavras. Logo, o amor é ação,
é atitude, é a alegria de viver, não só para o cuidador,
mas para o doente também.
E, ao estarmos cuidando, amparando,
sendo os ”interpretadores” das suas necessidades, estamos
praticando, sem esforço, o amor verdadeiro e, melhor, sem nos darmos
conta que estamos nos deixando amar pelo nosso próximo e por Deus.
Muitas
vezes, ela nem se dá conta do quanto é sublime e solidário as
pequenas ações do dia a dia, um bom dia, um olhar que enxerga
aquele que está na sua frente, uma escuta sensível, que é capaz de
ouvir o que está por traz de um lamento. São vivências de luz, se
em cada um de nós existe uma partícula divina, talvez por isso
tenhamos que valorizar tanto as nossas relações, principalmente as
cuidativas. Não basta cuidar pensando o outro, enquanto corpos
enfermos.
Precisamos
cuidar pensando o outro, enquanto uma alma enferma. Somos, sim, um
feixe de luz. Cuidar é iluminar a escuridão do outro. O
verdadeiro Amor que você agregar às suas tarefas do seu dia a dia,
realmente será a única saída para você suportar o que eu tenho
enfrentado.
A cada sorriso que eu tiro dos lábios da minha amada mãe; a cada feridinha que eu ajudo a curar no corpo dela; a cada resultado positivo dos exames de rotina que recebo; a cada noite que a vejo cheirosinha, a dormir mais uma noite de sono tranquilo, o meu Ser se enche de Paz, por mais um dia de dever cumprido em minha vida.
Enfim,
a cada dia que a minha amada mãe vive ao meu lado é um grande “troféu”
que recebo por estar conseguindo combater esse Mal com todo o Bem.
Apesar
dos conflitos familiares cada vez mais dolorosos,
o grande amor que tenho pela minha amada mãe, me leva a transpor
todas as barreiras, e uma certeza maior, sinto a presença do
grande mestre Jesus em minha vida. A ele, somente a ele a minha
gratidão!.
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