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Apesar de serem interligados, os circuitos da memória são
independentes. Isso explica o caso de pessoas que sofrem determinadas
lesões cerebrais e por conseqüência não são
mais capazes de formar nenhuma memória nova, apesar de poderem
evocar perfeitamente lembranças antigas. "Se você mostrar
uma lista de palavras a uma pessoa com uma lesão no giro angular,
ela pode não lembrar de nenhuma delas logo em seguida. No entanto,
se você perguntar 10 ou 20 minutos depois, ela talvez se recorde
de algumas", ilustra o neurofisiologista Gilberto Xavier, do Instituto
de Biociências da Universidade de São Paulo. As memórias
são formadas por sinapses, ou conexões entre os neurônios
(ver abaixo). Quando as sinapses não são utilizadas, atrofiam-se,
e as lembranças ligadas a elas podem enfraquecer e até desaparecer
completamente. Isso acontece quando você não vê alguma
pessoa há muito tempo e a imagem dela vai se "apagando"
do seu cérebro até que chega a ser quase impossível
recordar as feições de seu rosto.
É como um músculo que não é exercitado e
fica fraco. Seja por falta de uso ou por degeneração causada
por doenças como o Alzheimer, é assim que ocorre o esquecimento
real. Os outros mecanismos de falhas na evocação de memórias
caracterizam-se mais precisamente como omissão de lembranças.
Desses, um dos mais estudados é a repressão, processo descrito
originalmente por Freud. "A repressão é uma idéia
freudiana de que existe uma força ativa no cérebro que tenta
impedir que material desagradável venha à consciência.
Não há evidência científica disso, o que existe
é evidência de supressão", acredita James McGaugh.
Porém, outros cientistas acreditam que repressão e supressão
sejam nomes diferentes para o mesmo fenômeno.
O esquecimento no cérebro |
As memórias são formadas por sinapses (conexões entre os neurônios).
Esse mecanismo consiste na justaposição entre os prolongamentos neuronais
chamados axônios e dendritos. A ilustração mostra o terminal de um
neurônio (A) em contato com outro neurônio (B). Entre os dois há a
fenda sináptica, onde o primeiro neurônio deposita os neurotransmissores
que serão reconhecidos pelos receptores do segundo. |
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1. Córtex entorrinal
(laranja): também afetado pelo Alzheimer, como o hipocampo
(azul), é fundamental para a evocação de memórias
já consolidadas
2. Córtex pré-frontal: tem papel fundamental
na repressão
3. Amígdala: importante no funcionamento da memória
de trabalho
4. Hipocampo: peça-chave em todos os processos da
memória, é afetado pelo Alzheimer e é fortemente
ligado ao processo de extinção, mecanismo que também
é processado pela amígdala e córtex pré-frontal
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Fonte:
Iván Izquierdo
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Esquecer é viver
Michael Anderson, da Universidade de Oregon, é um dos maiores especialistas
nesse campo. Duas pesquisas suas, uma publicada em 2001 e a outra em 2004,
demonstraram que o mecanismo de repressão descrito por Freud é
real. Anderson fez testes com voluntários nos quais os fazia associar
pares de palavras aleatórias e depois os estimulava a lembrar apenas
da primeira palavra de cada par e a esquecer a segunda. O resultado foi
que os indivíduos tiveram dificuldade em recordar as palavras reprimidas,
mesmo quando lhes ofereciam dinheiro por isso. "Eu não diria
que eu apaguei as memórias, mas os voluntários as inibiram,
tornando-as mais difíceis de serem lembradas quando desejado",
explicou Anderson a Galileu. Assim como tudo o que acontece no organismo,
o mecanismo de repressão tem suas funções, como suprimir
lembranças dolorosas e até garantir a sobrevivência
da espécie humana. "Sem a repressão nenhuma mulher
teria mais de um filho, porque estaria relembrando continuamente a dor
do parto", esclarece o neurocientista Iván Izquierdo, do Centro
da Memória do Instituto de Biociências da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
Deu branco! |
Conheça melhor os mecanismos de esquecimento e falhas
na retenção e evocação das memórias |
Esquecimento
real (amnésia)
Ocorre quando as sinapses neuronais atrofiam e morrem por falta de
uso, por morte celular decorrente do envelhecimento (amnésia
senil benigna), intoxicação por drogas, traumatismo,
enfarte cerebral e doenças degenerativas como o Alzheimer.
A situação na qual alguém sofre um trauma ou
acidente e esquece tudo (inclusive o próprio nome), retratada
em filmes com freqüência, é rara. Porém,
pode ser o caso do "Homem do Piano", um jovem entre 20 e
30 anos encontrado em uma praia da Inglaterra em abril. Ele não
pronuncia nenhuma palavra, mas passa horas tocando piano com grande
habilidade.
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Bloqueio
de aquisição
Quando a memória não chega a se consolidar acontece
o bloqueio de aquisição. Pode acontecer por intoxicação:
uma pessoa altamente alcoolizada, por exemplo, provavelmente não
vai conseguir aprender informações novas. É muito
comum isso acontecer por traumatismo, típico no caso de acidente
de automóvel. O indivíduo bate o carro, desmaia, acorda
e não tem a menor idéia nem de que estava dirigindo.
Seu cérebro destruiu aquela informação, quando
estava no processo de arquivamento ocorreu o traumatismo que o impediu
de gravar.
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Repressão
Também pode ser voluntária ou involuntária. Acontece
quando nosso cérebro "decide" ou nós mesmos
resolvemos acabar com uma memória que nos perturba muito, como
um trauma. Também chamada de supressão, reprime a lembrança
de fatos desagradáveis, como conseqüência da negação
ou da inibição de uma memória prejudicial, negativa
ou má, principalmente as de dor ou de humilhações.
Às vezes fazemos força para não lembrar, mas
o sistema é mais
eficiente quando inconsciente.
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Bloqueio
de evocação
É o famoso "branco", quando queremos lembrar de algo
e não podemos porque estamos muito nervosos ou distraídos.
"Em um momento de alto estresse e ansiedade, seu cérebro
acha muito mais importante que você se defenda do que esteja
causando isso em detrimento de que você passe no vestibular,
por exemplo", explica Izquierdo. Outros fatores que embaralham
a memória são disfunções hormonais, distúrbio
de ansiedade, depressão, tumores, uso de drogas e deficiência
de vitamina B12. Estudo recente da Universidade de Michigan mostrou
que fumar cigarro diminui o fluxo sanguíneo em áreas
envolvidas na formação de memórias.
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Extinção
Acontece quando há uma desassociação de estímulos.
Na ocasião dos ataques terroristas ao World Trade Center em
2001, provavelmente a maioria das pessoas associou a imagem das torres
gêmeas em chamas com perigo e morte, mas com o tempo, depois
que o impacto já passou e que assistimos à imagem repetidas
vezes, passamos a associar esse evento com outros estímulos,
"apagando" o primeiro. Outro exemplo é quando uma
pessoa que conhecemos se casa e muda de nome. A princípio associaremos
aquele indivíduo com seu nome de solteiro, mas aos poucos a
lembrança do novo nome se tornará mais forte e acabará
substituindo a outra.
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