sábado, 22 de junho de 2013

O AMOR QUE PERMANECE, APESAR DO ALZHEIMER


Sobre o amor, dizia Fernando Pessoa: Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo? Ou pelas palavras de Antoine de Saint-Exupéry: O verdadeiro amor nunca se desgasta. Quanto mais se dá mais se tem.

O amor parece mesmo uma fonte inesgotável, um reservatório de emoções e sentimentos. O Alzheimer o consome  consumido pelas mazelas do tempo, uma mente e um corpo arrasados pela evolução da doença. As expressões iniciais de Fernando Pessoa e  Antonie, não poderiam ter palavras mais fortes para definir os sentimentos do companheiro de um portador de Alzheimer. Um exemplo de que quando se ama, há entrega e liberdade para exercer o pleno direito de simplesmente amar e entregar-se, mantendo-se íntegro e fiel à esse amor, independente de passado, futuro e presente, ou simplesmente do fato dessas fazes não mais existirem na mente do amado.

O amor do marido, ou da esposa e até mesmo da família revelam um importante auxilio no trajeto entre o antes e o depois do paciente com Alzheimer. É uma dura batalha, seguida de altos e baixos, lembranças tão presentes e em segundos um saudosismo, acompanhado do completo esquecimento de quem sempre foi seu mais perfeito amor.

Talvez essa fase difícil, ao qual precisamos chamar de doença, ou patologia, ou transtorno pelos seus mais diversos agravos a saúde psicossomática de um indivíduo, talvez seja a mais perfeita prova de amor que alguém revela para seu companheiro. O estar junto, perto, próximo, com você, mas estar lá, para juntos, de mães dadas, ou ao lado seguir um caminho difícil, baseado no viver e no deixar de viver, por não saber mais quem é, ou quem um dia foi. Quando falo de uma prova de amor, quero falar das dificuldades que passam a existir na vida de uma família que  tem um portador de Alzheimer. 

Um casal está junto há 30 anos e aos poucos, aqueles pequenos e bobos esquecimentos passam a existir no dia-dia daquela família. Em poucos meses o amado já não mais é reconhecido, como quem sempre foi. Seu fiel companheiro e amor da vida inteira, a angústia passa a existir no coração daquela mulher que não entende o porquê de tamanhas falhas de memória, do porque desta vez não foi o encontrar na porta e deixar os chinelos perto da poltrona e as deixou logo ali, ao lado da geladeira, ela já não associa os fatos. A família percebe os lapsos, mas espera... Escondida não se sabe, se na falta de informação, preconceito, na ausência de paciência para lidar com o problema, ou simplesmente no descaso.

Quando escolhemos alguém para amar, precisamos intensamente da atenção desse alguém. É preciso que ele nos perceba que queira saber da nossa vida, que questione e imponha-se na participação e decisões que seu coração deseja tomar. 

Conviver com alguém que simplesmente um dia acorda e não se recorda do seu rosto é um grande choque. Um descobrimento crucial na vida do companheiro, que já não se identifica na vida do outro e passa a se sentir “sobrando”. Mas no fundo da alma do amor que aparenta ter morrido para o outro, ainda existem lembranças, um trecho daquela canção especial que foi dançada a primeira vez  a décadas atrás, ou um perfume que a recorda o cheiro do cabelo desse amor agora distante demais, que talvez nesse momento para ela, nunca tenha existido e que para ele continua em sua alma e espera um dia poder ser relembrado.

Esse “descobrimento especial” é algo que talvez que pode ser visto, como uma nova chance, de todos os dias reconquistar de forma diferente aquela pessoa que você sempre amou. “Hoje a noite eu vou conversar com você, mas amanhã, talvez eu não me recorde do seu rosto” essa é uma afirmativa do portador de Alzheimer, se ele entendesse e  conseguisse expressar em palavras os acontecimentos de sua mente.

Estar junto nesse momento da vida é provar, agora bem mais que antes o tamanho do seu amor. É pegar na mão e levar o amor da sua vida adiante, agora orientado e guiado por suas mãos... Aquelas, que há muitos anos não se tocavam, ou que todos os dias no final da tarde passeavam pelo jardim.
http://portaldoenvelhecimento.org.br/

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