sexta-feira, 14 de junho de 2013

REPERCUSSÕES DA DOENÇA DE ALZHEIMER NO CUIDADOR

 

A doença de Alzheimer vai condicionar alterações não só no doente, mas também na família ou meio onde está inserido, pois a perda progressiva de independência obriga sempre a que alguém, de uma forma natural ou não, assuma os cuidados ao doente. A dependência funcional sendo consequência de uma deficiência e/ou de uma incapacidade/restrição da atividade, constitui uma desvantagem social/restrição da participação, que leva à necessidade de ajuda de terceiros para a execução de determinadas atividades (Botelho, 1999). 

O cuidador é a pessoa que mantém as necessidades básicas do doente, que o orienta, que o vigia, podemos dizer que é um instrumento muito valioso no seu tratamento. O conceito de cuidador é muito discutido, pode ser designado como alguém que assume a responsabilidade de cuidar, dar suporte ou assistir alguma necessidade da pessoa cuidada, visando a melhoria da sua saúde (Duarte, 2000). 

Pode acontecer que o cuidador não se encare a si mesmo como tal nem goste do termo, vendo-se mais como companheiro, filho ou amigo. A origem do cuidador pode ser determinada pela proximidade parental, proximidade física e proximidade afetiva (Martins, 2003). A pessoa que presta cuidados a um doente afetado de doença de Alzheimer é, na maioria das vezes, o parente próximo que habitualmente com ele coabita, em cerca de 70% das situações é o marido ou a mulher quem cuida, com o auxílio dos filhos de outros parentes e vizinhos, ou sem qualquer outra ajuda. 

Esta relação doente-cuidador é considerada normal segundo as regras sociais e, por isso, considerada na maioria das situações como natural e inevitável. Estima-se que cerca de 40% dos cuidadores não recebam ajuda de ninguém, até mesmo de parentes próximos mas também é verdade que eles tendem a rejeitar o apoio externo, por vezes por sentimentos de culpa ou obrigação moral (Flórez, 1997).

Os cuidados ao doente vão variando com a progressão e características da doença. Na fase inicial são os problemas e as consequências do diagnóstico, que mais afectam ambos (doente e cuidador). As dificuldades em tarefas mais complexas e instrumentais da vida diária vão obrigando o cuidador a assumir e/ou orientar tarefas complexas que o doente está incapaz de cumprir e que, muitas vezes, o cuidador não está habituado a realizar.

Á medida que a doença evolui, o doente vai tendo cada vez mais dificuldades e o cuidador tem de assumir todas as tarefas que competiam ao doente e a orientação em tarefas mais simples. A tarefa de cuidar de uma pessoa com doença de Alzheimer é árdua, fatigante e difícil, muito alargada no tempo, normalmente sem descansos e, às vezes, com responsabilidades que ultrapassam o razoável (Sánchez, 2004).

A desorientação, a perda da crítica e as alterações da conduta social, obrigam a uma vigilância quase constante do doente, isto vai exigir muito dos prestadores de cuidados e  afectar-lhes a saúde física,  mental, a vida familiar, o trabalho e as finanças. Cuidar de uma pessoa com demência é diferente de cuidar de outros doentes, visto que esta doença requer mais tempo e tem um maior impacto no emprego, na força do cuidador, na sua saúde física e psicológica e nos conflitos familiares (Mittelman,1995). 

Cuidar de uma pessoa doente dependente com deterioração cognitiva não é fácil, pode traduzir uma sobrecarga intensa que pode comprometer a saúde, a vida social e o bem-estar emocional do cuidador, cujo papel está bem evidente nos diferentes estudos realizados por Schneider (1999), Grand (1999), Rodriguez (2003), Sansoni (2004), citados por Garrett (2005), para a identificação dos factores que contribuem para os sentimentos de sobrecarga e depressão neste grupo.

Para além do enorme impacto psicológico de ver um ente próximo perder a sua capacidade intelectual e compostura social, segundo Garrett (2005), outras razões existem para a sobrecarga do cuidador:
- Perda de liberdade, incapacidade de usufruir de tempos de lazer, de férias de fins-de-semana, etc.;
- Sobrecarga de trabalho e muitas vezes o ter de assumir tarefas nunca realizadas;
- Desconhecimento sobre a forma como a doença se manifesta e da forma de lidar com essas manifestações;
- Dificuldades financeiras;
- Presença de alterações psicopatológicas. 
         
Para além destas, existem sobrecargas “escondidas”(WHO, 2001):
- Rejeição social que leva ao isolamento do doente e do cuidador;
- Dificuldade de acesso a uma vida familiar e social normal para ambos;
- Dificuldade no acesso ao apoio médico e a redes de suporte sociais.

Quando a doença progride, os cuidadores ficam frequentemente sem contato com o resto da família, os amigos e fora das atividades sociais habituais. Mesmo os cuidadores mais dedicados lutam com sentimentos de culpa, ressentimento ou frustração quando lidam com as difíceis mudanças comportamentais que a demência causa. É referido por Coen e Swanwick (1997) que o doente começa a apresentar alterações psicopatológicas tais como agressividade e agitação, falsas interpretações e alucinações que vão dificultar a sua relação com quem o cuida.

Contudo, os cuidadores diferem na forma como lidam com a situação, sendo uns melhor sucedidos que outros, num estudo realizado por Vugt et al (2004) concluíram que o sexo, a educação e a personalidade do cuidador são determinantes importantes na gestão dos cuidados. A forma como o cuidador lida com a pessoa doente é um factor preditivo de agitação no doente e exaustão do próprio cuidador.

A sobrecarga do cuidador, segundo Braithwaite (1992) citado por Martins (2003), é  uma perturbação resultante do lidar com a dependência física e a incapacidade mental do indivíduo alvo da atenção dos cuidados. A autora descreve o processo de cuidar de um familiar idoso e/ou dependente como contínuo e quase sempre irreversível, comportando cinco situações de crise: consciência da degeneração, imprevisibilidade, limitações de tempo, relação afectiva entre cuidador e sujeito alvo dos cuidados e a falta de alternativas de escolha.

Se a tarefa de cuidar não é compartilhada com outras pessoas, se o cuidador não tem ajuda ou folgas, podem surgir situações de risco para o cuidador e para o utente, maus-tratos físicos resultantes do stress e tensão acumulados ao longo dos anos. O aparecimento das alterações psicopatológicas agrava a sobrecarga sobre o cuidador e modifica a relação entre eles. Esta é a fase crucial para o cuidador, pois para além da sobrecarga provocada pelos cuidados ao doente, junta-se a frustração pela inevitabilidade da progressão da doença (Mendes, 2003). Envolver a família e os amigos na tarefa de cuidar do doente, ajuda o cuidador e proporciona apoio à pessoa que recebe os cuidados. Se na família houver um clima de entreajuda só há que ser franco e esclarecer os outros membros como se poderão tornar úteis, quantas vezes as pessoas desejam poder ajudar mas desconhecem a situação, ou receiam fazer ofertas nesse sentido.


Deste modo, e dada a extensão e complexidade desta doença que atinge essencialmente os idosos, esta patologia repercute-se de tal forma sobre a família como um todo e, especialmente, sobre o cuidador. Este irá prestar os cuidados ao seu doente, muitas vezes sem conhecer as condutas adequadas face às manifestações da doença e exigências do cuidar. Assim, torna-se essencial a intervenção dos profissionais de saúde, não só para instruir o cuidador no acto de cuidar, mas também para avaliar as possíveis repercussões nesta pessoa que possam advir do acto de cuidar, bem como alertá-la para a ocorrência das mesmas. As intervenções terapêuticas junto dos prestadores de cuidados informais deverão ser conduzidas em relação a três vertentes principais: apoio psicológico, educação/informação e sistemas sociais de apoio (Brito, 2002).

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