A doença de Alzheimer vai
condicionar alterações não só no doente, mas também na família ou meio onde
está inserido, pois a perda progressiva de independência obriga sempre a que
alguém, de uma forma natural ou não, assuma os cuidados ao doente. A
dependência funcional sendo consequência de uma deficiência e/ou de uma incapacidade/restrição
da atividade, constitui uma desvantagem social/restrição da participação, que
leva à necessidade de ajuda de terceiros para a execução de determinadas
atividades (Botelho, 1999).
O cuidador é a pessoa que mantém as necessidades
básicas do doente, que o orienta, que o vigia, podemos dizer que é um
instrumento muito valioso no seu tratamento. O conceito de cuidador é muito
discutido, pode ser designado como alguém que assume a responsabilidade de
cuidar, dar suporte ou assistir alguma necessidade da pessoa cuidada, visando a
melhoria da sua saúde (Duarte, 2000).
Pode acontecer que o cuidador não se
encare a si mesmo como tal nem goste do termo, vendo-se mais como companheiro,
filho ou amigo. A origem do cuidador pode ser determinada pela proximidade
parental, proximidade física e proximidade afetiva (Martins, 2003). A pessoa
que presta cuidados a um doente afetado de doença de Alzheimer é, na maioria
das vezes, o parente próximo que habitualmente com ele coabita, em cerca de 70%
das situações é o marido ou a mulher quem cuida, com o auxílio dos filhos de
outros parentes e vizinhos, ou sem qualquer outra ajuda.
Esta relação
doente-cuidador é considerada normal segundo as regras sociais e, por isso,
considerada na maioria das situações como natural e inevitável. Estima-se que
cerca de 40% dos cuidadores não recebam ajuda de ninguém, até mesmo de parentes
próximos mas também é verdade que eles tendem a rejeitar o apoio externo, por
vezes por sentimentos de culpa ou obrigação moral (Flórez, 1997).
Os cuidados ao doente vão
variando com a progressão e características da doença. Na fase inicial são os
problemas e as consequências do diagnóstico, que mais afectam ambos (doente e
cuidador). As dificuldades em tarefas mais complexas e instrumentais da vida
diária vão obrigando o cuidador a assumir e/ou orientar tarefas complexas que o
doente está incapaz de cumprir e que, muitas vezes, o cuidador não está
habituado a realizar.
Á medida que a doença evolui, o doente vai tendo cada vez
mais dificuldades e o cuidador tem de assumir todas as tarefas que competiam ao
doente e a orientação em tarefas mais simples. A tarefa de cuidar de uma pessoa
com doença de Alzheimer é árdua, fatigante e difícil, muito alargada no tempo,
normalmente sem descansos e, às vezes, com responsabilidades que ultrapassam o
razoável (Sánchez, 2004).
A desorientação, a perda da
crítica e as alterações da conduta social, obrigam a uma vigilância quase
constante do doente, isto vai exigir muito dos prestadores de cuidados e afectar-lhes a saúde física, mental, a vida familiar, o trabalho e as
finanças. Cuidar de uma pessoa com demência é diferente de cuidar de outros
doentes, visto que esta doença requer mais tempo e tem um maior impacto no emprego,
na força do cuidador, na sua saúde física e psicológica e nos conflitos
familiares (Mittelman,1995).
Cuidar de uma pessoa doente dependente com
deterioração cognitiva não é fácil, pode traduzir uma sobrecarga intensa que
pode comprometer a saúde, a vida social e o bem-estar emocional do cuidador,
cujo papel está bem evidente nos diferentes estudos realizados por Schneider
(1999), Grand (1999), Rodriguez (2003), Sansoni (2004), citados por Garrett
(2005), para a identificação dos factores que contribuem para os sentimentos de
sobrecarga e depressão neste grupo.
Para além do enorme impacto
psicológico de ver um ente próximo perder a sua capacidade intelectual e
compostura social, segundo Garrett (2005), outras razões existem para a
sobrecarga do cuidador:
- Perda de liberdade, incapacidade
de usufruir de tempos de lazer, de férias de fins-de-semana, etc.;
- Sobrecarga de trabalho e muitas
vezes o ter de assumir tarefas nunca realizadas;
- Desconhecimento sobre a forma
como a doença se manifesta e da forma de lidar com essas manifestações;
- Dificuldades financeiras;
- Presença de alterações
psicopatológicas.
Para além destas, existem sobrecargas “escondidas”(WHO, 2001):
- Rejeição social que leva ao
isolamento do doente e do cuidador;
- Dificuldade de acesso a uma vida
familiar e social normal para ambos;
- Dificuldade no acesso ao apoio
médico e a redes de suporte sociais.
Quando a doença progride, os
cuidadores ficam frequentemente sem contato com o resto da família, os amigos
e fora das atividades sociais habituais. Mesmo os cuidadores mais dedicados
lutam com sentimentos de culpa, ressentimento ou frustração quando lidam com as
difíceis mudanças comportamentais que a demência causa. É referido por Coen e
Swanwick (1997) que o doente começa a apresentar alterações psicopatológicas
tais como agressividade e agitação, falsas interpretações e alucinações que vão
dificultar a sua relação com quem o cuida.
Contudo, os cuidadores diferem na
forma como lidam com a situação, sendo uns melhor sucedidos que outros, num
estudo realizado por Vugt et al (2004) concluíram que o sexo, a educação e a
personalidade do cuidador são determinantes importantes na gestão dos cuidados.
A forma como o cuidador lida com a pessoa doente é um factor preditivo de
agitação no doente e exaustão do próprio cuidador.
A sobrecarga do cuidador, segundo
Braithwaite (1992) citado por Martins (2003), é
uma perturbação resultante do lidar com a dependência física e a
incapacidade mental do indivíduo alvo da atenção dos cuidados. A autora descreve
o processo de cuidar de um familiar idoso e/ou dependente como contínuo e quase
sempre irreversível, comportando cinco situações de crise: consciência da
degeneração, imprevisibilidade, limitações de tempo, relação afectiva entre
cuidador e sujeito alvo dos cuidados e a falta de alternativas de escolha.
Se a tarefa de cuidar não é
compartilhada com outras pessoas, se o cuidador não tem ajuda ou folgas, podem
surgir situações de risco para o cuidador e para o utente, maus-tratos físicos
resultantes do stress e tensão acumulados ao longo dos anos. O aparecimento das
alterações psicopatológicas agrava a sobrecarga sobre o cuidador e modifica a
relação entre eles. Esta é a fase crucial para o cuidador, pois para além da
sobrecarga provocada pelos cuidados ao doente, junta-se a frustração pela
inevitabilidade da progressão da doença (Mendes, 2003). Envolver a família e os
amigos na tarefa de cuidar do doente, ajuda o cuidador e proporciona apoio à
pessoa que recebe os cuidados. Se na família houver um clima de entreajuda só
há que ser franco e esclarecer os outros membros como se poderão tornar úteis,
quantas vezes as pessoas desejam poder ajudar mas desconhecem a situação, ou
receiam fazer ofertas nesse sentido.
Deste modo, e dada a extensão e
complexidade desta doença que atinge essencialmente os idosos, esta patologia
repercute-se de tal forma sobre a família como um todo e, especialmente, sobre
o cuidador. Este irá prestar os cuidados ao seu doente, muitas vezes sem
conhecer as condutas adequadas face às manifestações da doença e exigências do
cuidar. Assim, torna-se essencial a intervenção dos profissionais de saúde, não
só para instruir o cuidador no acto de cuidar, mas também para avaliar as
possíveis repercussões nesta pessoa que possam advir do acto de cuidar, bem
como alertá-la para a ocorrência das mesmas. As intervenções terapêuticas junto
dos prestadores de cuidados informais deverão ser conduzidas em relação a três
vertentes principais: apoio psicológico, educação/informação e sistemas sociais
de apoio (Brito, 2002).
Nenhum comentário:
Postar um comentário