Primeiro, é preciso considerar
que a outra opção a envelhecer é morrer jovem. Isso, por si só, já é um enorme
argumento - eu acho que o meu pai, por exemplo, preferia estar enfrentando os
embates de seus 65 anos a ter morrido aos 51. Minha percepção...
Depois, envelhecer te dá uma
certa autonomia - não digo financeira, que essa é uma das complicações da
idade, já que tudo fica mais caro (remédios, planos de saúde, dietas), e as
pessoas, com poucas exceções e por razões diferentes, têm seus recursos
diminuídos.
Mas a autonomia de que falo é
aquela de não ter mais que se explicar. Na juventude, exceto os impulsos
desmedidos e eventuais e as loucuras por paixões desatinadas, tudo é ponderado
em cima do custo-benefício. As decisões que tomamos têm base no que queremos
(ou achamos que) para o futuro. E sempre temos que argumentar - para nós ou
para pais e amigos - o porque dessa ou daquela escolha.
Na velhice, não. Você pode querer
um iPad de última geração e se alguém te perguntar para que - já que você tem
computador em casa -, dizendo que você não trabalha mais, sai pouco e isso não
lhe teria 'real' utilidade, você pode responder apenas 'porque eu quero'. Oras
bolas! Quem foi que instituiu a 'real' utilidade das coisas? Na velhice, você
pode ter um iPad para responder seus emails, navegar pelo Facebook e jogar
bingo virtual nas três horas que têm de enfrentar entre um exame e outro, entre
procedimentos diferentes, na sala de espera de exames. Por que não?
Na velhice você também pode se
casar de novo e quantas vezes quiser. Conheço um senhor, mais jovem do que
muitos jovens, que aos oitenta e cinco anos está no terceiro casamento - depois
de ter sido casado quase sessenta com a primeira esposa. Mas no mesmo ano em
que a perdeu, casou-se novamente com uma antiga namorada que reencontrou por
acaso, também viúva. E quando a fatalidade, dois anos depois, também lhe ceifou
esse que parecia ser seu 'romance de inverno', ele não se fez de rogado: chorou
alguns meses, sacudiu a dor e foi à luta: casou-se com uma velha amiga da
filha. E quando os filhos questionaram, ele respondeu: "Por que não?
Porque tenho que ficar sozinho?" E quando argumentaram que ele não
guardava nem o tempo do luto, retrucou: "Mas na minha idade não posso me
dar a esse luxo! Quanto tempo me resta para ser feliz e desfrutar a vida?"
Pois é... Com todo respeito às senhorinhas-adoráveis-esposas que partiram, sou
obrigada a lhe dar razão... E como dizia meu pai, "viúvo é quem morre!"
Na velhice, salvo se sua saúde
estiver muito debilitada, você pode morar onde quer. Na juventude, primeiro
você mora onde pode; depois, com filhos e afins, onde precisa; finalmente, você
pode morar onde quer. E isso significa, por exemplo, a despeito da opinião
alheia, continuar morando naquela casa grande (caso da minha mãe, por exemplo),
com quartos que você raramente usa e espaço para uma família que visita apenas
ocasionalmente. Mas quem foi que colocou como regra que quando a gente
envelhece tem que morar numa kitnet? A antiga casa tem uma vida inteira
encerrada nas paredes. Na velhice, as pessoas não querem abandonar esses
'livros' esculpidos nas memórias de suas salas e jardins, outrora cheios de
pessoas queridas...
Na velhice, você pode andar meio
desleixado, desatento, ser extravagante. Você pode dormir até tarde, sentar-se
na varanda sem pressa, esquecer...
Na velhice, não importam mais os
erros cometidos (não dá mais pra consertar o passado), os julgamentos, os
questionamentos. Não é preciso mais explicar, nem entender - os jovens é que
têm que compreender que os velhinhos querem poder ficar onde eles querem, onde
precisam, onde sentem-se bem, com os objetos, pessoas, desejos que eles ainda
podem escolher.
Porque, na velhice, estamos
livres!
[Debora Bottcher]
http://www.cronicadodia.com.br
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