Assim como eu que cuido de minha
mãe, portadora da Doença de Alzheimer tenho a certeza que existem milhões de
filhas e filhos cuidadores que são amorosos, centrados, dedicados, enfermeiros
(quando necessário), enfim, seres humanos preocupados com o bem estar e
dignidade de seus entes queridos.
E, nesse cuidar no dia a dia,
somos sempre cobrados ou lembrados para
termos paciência, para sermos carinhosos, humildes, tolerantes etc. com o nosso familiar doente, como se não
soubéssemos disso. Cobranças essas que muitas vezes provocam no cuidador
sentimentos de frustração, porque ele está sendo o mais atingido nos aspectos
emocional, financeiro e social e não tem reconhecimento. Há cuidadores que
chegam a se culpar por não conseguirem demonstrar o que sentem em relação ao
seu doente; outros chegam a acreditar que não sabem amar ou que não conseguem
amar por terem sofrido maus tratos, quando crianças, nas mãos daquele familiar
que hoje depende dele. Uma avalanche de culpas aflora.
Como o amor se reveste de muitas
facetas ou subtítulos, acaba deixando dúvidas em quem está cuidando. O amor que muitos dizem não conhecer, já o
praticam nas mais variadas formas, porque amar, não é apenas dizer “Eu te amo”
de forma automatizada, sem sentimento e de maneira irrefletida. É transparecer
na expressão de uma emoção ou de um ato como um olhar, um abraço, um beijo, um
aperto de mão, que representa muito mais que mil palavras. Logo, o amor é ação, é atitude, é a alegria
de viver, não só para o cuidador, mas para o doente também. E, ao estarmos cuidando, amparando, sendo os
”interpretadores” das suas necessidades, estamos praticando, sem esforço, o
amor verdadeiro e, melhor, sem nos darmos conta que estamos nos deixando amar
pelo nosso próximo e por Deus.
Existem também aquelas facetas do
amor que são confundidas ou não são
notadas por quem as recebe e, até mesmo, por quem as pratica. A gentileza é uma delas, porque é uma forma de
amor que nos faz sentir o prazer em ajudar alguém, em acolher e ser gentil,
através de simples palavras e gestos como: obrigado, bom dia, boa tarde, um
sorriso, um atendimento cordial, um elogio, um pedido de desculpa. E, ao
praticá-la, tornamo-nos generosos porque
valorizamos o respeito, o amor altruísta, levando à pessoa o reconhecimento e a atenção que ela merece.
Paciência, a faceta mais exigida
e mais presente na vida de quem cuida, acaba se tornando virtude em algumas
pessoas. Só que não é simples assim, é necessário que aceitemos o outro, o seu
sofrimento, a sua dor e passemos a entender o que se passa em seu interior,
permitindo que ele se expresse, mude, tenha uma chance para demonstrar que está
feliz conosco. Nesse exercício da
paciência, só conseguimos êxito se tivermos a humildade de sairmos de nosso
casulo e sentirmos ou vivenciarmos o que o outro está sentindo. Temos que
aprender a aceitar as imperfeições dos outros, pois também somos pessoas
dotadas de imperfeições; temos que alavancar o espírito positivo do nosso
semelhante e nunca julgar ou condenar pelos seus atos.
O perdão, outra faceta do amor
que muitos dizem ser única e exclusivamente de Deus, pois é uma das mais
difíceis, se não a mais difícil, porque exige do ser humano a chance de melhorar, de encontrar a paz
interior e a sua saúde espiritual. Dizem
que o perdão nos livra de doenças, de sentimentos destrutivos que não nos fazem
bem. Muitas vezes, ele parece mesmo ser intransponível, principalmente, a quem
já sofreu maus tratos. O cuidador precisa entender que, no estágio em que se
encontra o doente, este já não se lembra do que fez, apenas sente se é amado. A
escolha deve ser nossa, porque quem perdoa faz bem a si próprio, reata o amor e
encontra a alegria de viver.
A generosidade, uma faceta tão
bonita e que está ligada ao desapego de si e de coisas materiais, o amor
espontâneo doado aos outros, o ato de
servir aos outros, de dedicar um tempo a quem precisa. Ser generoso é
partilhar, ser solidário ao próximo, mesmo tendo que renunciar a algo, fazer
sacrifícios pelo próximo. É ser cuidador de um doente com Alzheimer.
O amor em forma de cortesia,
humildade, honestidade também são presentes no cuidador. A primeira,
quando tratamos o outro como pessoa digna, única e
valiosa, em qualquer lugar ou situação,
estando ele na fila, no ônibus, na vizinhança
ou com um agradecimento... A
segunda,, uma das mais nobres facetas do
amor, refere-se à autenticidade, porque
está na igualdade de dignidade, de reconhecimento de valores e da aceitação
dos próprios erros. E a terceira é falar dos próprios sentimentos, com verdade,
com amor, com emoção e com aceitação das próprias limitações. É a transparência
de atitudes, o compromisso com a verdade.
E assim se mostra o amor, nos recantos onde
menos esperamos, nas ações que nos passam despercebidas porque nos habituamos a
presenciar sem sentir. ( Maria Sirlei Benini).
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