sexta-feira, 10 de maio de 2013

O IMPACTO DA DOENÇA NO CUIDADOR



A sobrecarga dos cuidadores é um dos mais importantes problemas causados pela demência (Grafstrom et al., 1992; Taub et al., 2004). O termo Burden (impacto) da língua inglesa tem recebido bastante atenção da literatura e é utilizado para descrever os aspectos negativos associados ao cuidado de um paciente dependente (Dunkin & Hanley, 1998; Garrido & Almeida, 1999; Mohide, 1993). Estes aspectos dizem respeito à presença de problemas, dificuldades ou eventos adversos que afetam significativamente a vida dos responsáveis pelo paciente (Garrido & Almeida, 1999) nos âmbitos físico, financeiro e emocional (Dunkin & Hanley, 1998).

Na literatura, estudos com grupos-controle evidenciam algumas diferenças entre cuidadores de idosos demenciados e outros grupos populacionais. Um estudo comparativo entre cuidadores de três grupos geriátricos diferentes - pacientes com DA, pacientes com demência vascular e idosos não demenciados - revelou que o impacto sofrido pelos cuidadores é maior em cuidadores de pacientes com DA (Rainer et al., 2002). Outros estudos indicaram que os cuidadores de pacientes com demência apresentavam maiores índices de impacto que cuidadores de pacientes com depressão, AVC ou idosos hígidos da comunidade (Garrido & Almeida, 1999). Cuidadores de pacientes com DA possuem maiores chances de ter sintomas psiquiátricos, mais problemas de saúde, maior freqüência de conflitos familiares e problemas no trabalho, se comparados a pessoas da mesma idade que não exercem o papel (Cerqueira & Oliveira, 2002). Outro estudo evidencia que cuidadores de idosos dementes apresentam um pior julgamento sobre a própria saúde, sentem-se mais estressados e com a vida afetiva e social mais limitada do que cuidadores de idosos não dementes (Grafstrom et al., 1992).

O impacto sofrido pelos cuidadores pode ser observado também na utilização de serviços de saúde, já que cuidadores de pacientes com DA consultam 46% mais médicos e utilizam mais medicamentos psicotrópicos - como antidepressivos e antipsicóticos - do que cuidadores de pacientes que não têm DA (Garrido & Almeida, 1999; Grafstrom et al., 1992; Haley, 1997). Pesquisas demonstram que os cuidadores apresentam uma piora na saúde física (Garrido & Menezes, 2004), um prejuízo no sistema imunológico, que pode persistir até quatro anos após o falecimento do paciente (Haley, 1997). Em decorrência do impacto, até 60% dos cuidadores podem desenvolver sintomas físicos e psicológicos. Os sintomas físicos mais comuns são: hipertensão arterial, desordens digestivas, doenças respiratórias e propensão a infecções. Sintomas psicológicos freqüentes são: depressão, ansiedade e insônia (Engelhardt et al., 2005). A saúde precária do cuidador é um fator que contribui para a institucionalização do paciente (Dunkin & Hanley; 1998; Haley, 1997; Grafstrom et al., 1992). Os altos índices de depressão em cuidadores de pacientes com DA são evidenciados com freqüência na literatura (Cerqueira & Oliveira, 2002; Engelhardt et al., 2005; Garrido & Almeida, 1999; Garrido & Menezes, 2004; Grafstrom et al., 1992; Haley, 1997; Rodrigues, Andrade & Mendes, 1995), chegando a atingir entre 30 e 55% dos cuidadores, os quais sofrem risco de desenvolver a doença duas a três vezes maior que o restante da população.

Para avaliar o impacto nos cuidadores é essencial que se desenvolvam instrumentos que possam medi-lo (Taub et al., 2004). Para atingir este objetivo, em 1985, Zarit e colaboradores desenvolveram a escala The Zarit Burden Interview (ZBI). A escala possui 22 questões que avaliam o impacto do cuidado nas esferas física, psicológica e social, com uma pontuação que pode variar de 0-4. A escala é bastante utilizada em pesquisas com cuidadores de idosos demenciados (Cerqueira & Oliveira, 2002; Garrido & Menezes, 2004; Taub et al., 2004). No Brasil, a confiabilidade da escala foi avaliada por Taub et al. (2004), demonstrando ser de fácil administração e confiável para medir o impacto apresentado pelos cuidadores de pacientes com demência.

Os fatores de Impacto no cuidador

O primeiro fator a ser considerado é o posicionamento da família diante da doença. Assim como a doença passa por vários estágios, a família passa por diferentes etapas. A princípio, a família não sabe o que está acontecendo diante das manifestações de déficit do paciente, gerando sentimentos de hostilidade e irritação. Do outro lado, o paciente pode perceber as próprias deficiências, correndo o risco de deprimir-se. À medida que a doença vai evoluindo, ocorre a busca por um diagnóstico, porém, nem sempre os familiares o aceitam rapidamente, podendo negá-lo, na tentativa de recuperar a " pessoa de antes" . Após a aceitação do diagnóstico, pode haver uma sensação de catástrofe. As famílias reagirão de maneiras diferentes, dependendo das próprias características (Goldfarb & Lopes, 1996). Podem ocorrer três posicionamentos indesejáveis entre os familiares: superproteção, evasão da realidade e expectativas exageradas com relação ao desempenho do paciente (Câmara et al.,1998). Os parentes que fazem evasão da realidade, ou seja, negam a doença, são geralmente os que mais sofrem; já os que assumem a função de cuidador tendem a monopolizar a função, colocando-se na posição de serem os únicos a fazer as coisas e abdicam de qualquer atividade que represente uma satisfação pessoal, acabando " heroicamente estressados" (Goldfarb & Lopes, 1996). Quando o paciente não reconhece mais seus familiares há um primeiro luto para a família, devido à " morte social do paciente" . O segundo luto ocorre com a morte biológica do ente querido (Goldfarb & Lopes, 1996).

Há situações nas quais a família não tem condições de cuidar do paciente e recorre à ajuda de uma pessoa, profissional ou não, que será remunerada para exercer o papel. Neste contexto entram em cena os cuidadores formais, sujeitos a passar por diversos conflitos com a família do paciente, podendo ser objeto de projeção de culpas e frustrações que não podem ser aceitas na família. Diante desta situação é recomendável que o cuidador formal seja discreto, passe por uma reciclagem de conhecimentos e possa conversar sobre as ansiedades das quais é portador (Goldfarb & Lopes, 1996).

Uma característica do paciente com DA é a necessidade de supervisão crescente, originando fatores de estresse para o cuidador. Pearlin (1990), citado por Engelhardt et al. (2005) sugere alguns estressores primários para os cuidadores, dividindo-os em subjetivos e objetivos. Os estressores objetivos vão se modificando ao longo da evolução da DA e incluem nível de dependência em AVDs e presença de distúrbios do comportamento. Os estressores subjetivos correspondem ao modo pelo qual os estressores objetivos são experimentados pelo cuidador. Estes dois estressores podem levar a conflitos familiares, problemas econômicos e a uma sensação de aprisionamento no papel de cuidador.

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