Quando os pais começam a
apresentar sinais de velhice, é freqüente que os filhos sintam-se irritados com
eles. Quando os filhos começam a cuidar dos pais doentes, não contam mais com a
figura sólida que representavam. Os sentimentos de raiva surgem, provavelmente,
para defender o filho de se defrontar com a fragilidade dos pais, já que pode
ser doloroso e triste para os filhos terem de perder a condição de serem cuidados
e protegidos para ocupar o lugar de quem protege (Eizirik et al., 1993; Lima,
2000).
É importante salientar que o que
ocorre, de fato, é uma troca de papéis e não de sua inversão; neste último
caso, quando os filhos tomam para si o lugar dos pais, provocam a infantilização
de seus pais e uma maior dependência dos mesmos.
A resistência frente à
transformação de papéis, que implica na maturidade dos filhos, pode provir de
qualquer uma das partes: os filhos podem insistir na atribuição de um papel
onipotente aos pais e impedir, desta forma, algum grau de regressão e
dependência; os pais, por sua vez, podem prender-se aos papéis do passado e se
negar a trocar sua figura de autoridade por outra mais de acordo com seu
momento atual.
Na relação familiar, durante os vários anos de convivência,
há uma série de trocas nos respectivos papéis, trazendo conseqüências nos
relacionamentos da família. Como exemplo, destaca-se Erikson e Erikson(1997,
p.92). Com o envelhecimento podemos sentir uma incerteza real sobre status e
papel: – Quão independente você consegue ser? Quem é você aos 85 anos, quando comparado
a quem era no meio da vida? O seu papel não é claro quando comparado à firmeza
da sua posição e propósito anteriores.
As doenças degenerativas, como no caso das demências tipo Alzheimer,
requerem uma constante adaptação da família à evolução do estado do idoso e dos
cuidados que exige. A necessidade de serviços de longa duração se produz num
período de restrição econômica, principalmente no contexto atual das famílias brasileiras.
No momento em que obtém o diagnóstico, a família
entra numa fase em que todos os membros podem compartilhar um conhecimento comum
da enfermidade e prever a organização do tratamento. Aceitar que um processo é
crônico é uma etapa que a família deve assimilar. À medida que o tempo passa e
o estado do paciente não melhora, alguns membros da família pensam,
secretamente, que ele não se curará. Quando os membros da família passam a admitir
falar sobre o assunto, a doença e suas vicissitudes se tornam mais suportáveis,
e isto facilita na divisão de papéis entre os familiares na resolução dos problemas
que daí advêm. A família pode, então, iniciar a tentativa de se reorganizar e
começar a integrar a enfermidade crônica nas suas relações cotidianas.
Logo, essas enfermidades crônicas exigem anos prolongados de
cuidados e a família tem que fazer reajustes periódicos, à medida que seus
membros passam por diferentes fases da vida (Busse e Blazer, 1999).
De um modo geral, a Doença de Alzheimer por ser uma
enfermidade crônica tem efeitos sobre o controle do corpo, o conceito de identidade
e as relações interpessoais. Se o agravamento é lento, a família corre o risco
de se esgotar durante os anos de assistência cotidiana.
Com o tempo, a tarefa mais
importante da família é estabelecer um equilíbrio entre a continuidade da assistência
ao paciente e a consideração das necessidades de cada um de seus membros. Para
os filhos, esta situação é desconcertante, pois, em alguns casos, a institucionalização
em casas geriátricas mobiliza sentimentos de resistência, tanto da parte do
paciente como dos familiares, e tampouco não conseguem compreender as reações
inesperadas que surgem ao oferecerem ajuda e apoio. A forma como estas
situações de crises são elaboradas por esses fi- lhos de 50, 60 anos ou mais
provavelmente vão interferir nas suas relações futuras com seus filhos e netos (Krassoievitch,
1988).
Ótima reflexão, pois muito pouco é falado acerca do que acontece com os filhos cuidadores. Sou um deles e tive que abdicar de minha vida profissional e pessoal.
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